Ele consegue colocar o ego de lado e atua de forma a atingir o melhor resultado para a equipe. Não segura informação, comunica ao chefe, à equipe e aos pares. Tampouco teme desenvolver pessoas, quer que seu subordinado seja o melhor da empresa e sempre tem um substituto à sua altura.
Se você acha que esse cara é você, espere um pouco. Em um mundo no qual os mercados estão cada vez mais interconectados, onde as empresas criam em um país e produzem em outro, o novo líder deve, ainda, ser flexível a ponto de se encaixar em qualquer cultura, precisa estar de malas prontas, além de seguir práticas sustentáveis e estar atento ao meio ambiente – afinal, se não cuidar do seu mercado, vai vender para quem?
Com tantos qualificativos, realmente, o novo líder é, no mínimo, alguém difícil de encontrar. O que ajuda a explicar o crescimento de 2500% nos últimos oito anos da Fesa, consultoria de recrutamento de altos executivos, criada há 18 anos.
“Esse é um setor que vai continuar crescendo. É impossível que uma empresa sozinha consiga atrair para seus quadros o talento necessário. A toda hora o mercado muda e a empresa tem que mudar sua estratégia, ou seja, precisa de um capital humano novo pra fazer funcionar o que foi definido”, explica Alfredo Assumpção, CEO da Fesa.
A mudança cada vez mais rápida do mercado é também o argumento de Assumpção para explicar a falta de talentos no mundo. Um levantamento feito pela Association of Executive Search Consultants (AESC) aponta que, neste ano, os países que mais sofrerão o apagão de talentos serão China (45,8%), Brasil (33,5%) e África do Sul (31,6%).
Segundo suas estimativas, há 30 anos, o total de honorários em consultoria para o recrutamento de líderes girava em torno de US$ 1 bilhão. Em 2012, esse montante foi de US$ 15 bilhões. Somadas as receitas com todo tipo de recrutamento, da base até o nível de presidência, é possível chegar a US$ 200 bilhões, mundialmente. Considerando tudo que as empresas gastam com suas áreas de recrutamento e seleção, chega-se a US$ 2 trilhões.

Em entrevista, Assumpção (também autor de "Talento - A Verdadeira Riqueza das Nações") fala sobre o apagão de talentos, além de apontar bons exemplos de líderes e de empresas que formam suas lideranças.
Dados da AESC (Association of Executive Search Consultants) apontam que China, Brasil e África do Sul serão os países com maior carência de talentos em 2013. Como o senhor vê isso?
Falta talento no mundo porque a economia é caótica e interconectada. Temos crise a cada dois anos. Ela surge em cascata e atinge o mundo todo, de uma forma ou de outra. A crise do subprime não atingiu o Brasil de primeira, mas atingiu a Europa e, mais recentemente, chegou ao Brasil, que está exportando menos. O mundo acadêmico, até a última década formava executivos que já chegavam à empresa já entendendo o modo de trabalho. Isso porque a crise se dava em média a cada 10 anos. Agora, a crise se dá a cada dois anos, então, o mundo acadêmico não forma em tempo o executivo necessário no mundo corporativo. Cai-se num leilão de capital humano.
Que perfil de líder se encaixa nesse mundo tão dinâmico e interconectado?
O grande executivo hoje é aquele que tem atitude pra se ajustar a diferentes ambientes. É aquele que sabe jogar em time, sabe trabalhar servindo e se fazendo servir. É impossível você saber de tudo, então, precisa ter diversidade [em uma equipe], somar essa diversidade, aproveitar as diferenças ao máximo para ter um grande produto, barato e de qualidade, que é o que o mercado está demandando. E ele ainda tem que prestar atenção na sustentabilidade e no meio ambiente, porque se não cuidar do mercado, não tem pra quem vender o produto. Esse é o grande desafio da liderança que chega.
Qual a saída para as empresas preencherem essas vagas?
Se a economia está mais interconectada e os mercados são mais importantes que as nações, o mais importante é ter esse "gladiador da economia", o executivo talentoso, bem informado, pronto para viajar pra qualquer lugar do mundo. É o caso de uma InBev, do JBS etc. A Apple, por exemplo, “pensa” nos Estados Unidos e fabrica na China.
O que caracteriza um líder?
Quando o Bernardinho tira o levantador da equipe, que era o principal jogador do time, porque não está ajustado aos colegas, não está jogando como time e nem servindo, você pensa: puxa, mas ele tirou a estrela do time. Bem, ele passou um aperto, mas foi campeão. O [Luiz Felipe] Scolari também tirou o Romário e foi campeão. É isso que a empresa precisa fazer. Ela precisa do executivo que está para servir.
Ainda de acordo com a AESC, faltarão principalmente executivos de alto escalão, como CEOs, COOs, e diretores. É uma oportunidade para empresas como a Fesa, mas como resolver isso? Formar um CEO, não é tarefa fácil...
O mundo acadêmico está sempre atrasado. Ele pesquisa as melhores práticas nas empresas e traz para as salas de aula. Quando o estudante se forma, já aconteceu uma nova crise e as empresas já se ajustaram. Por isso ele chega atrasado, o que significa que precisam formar esse profissional dentro de casa. A saída para as empresas é formar o seu futuro executivo. As grandes multinacionais fazem isso. No Brasil, é mais difícil. Temos uma carga tributária absurda. Antes, havia programas de trainees em número muito maior. O empresário brasileiro fica em desvantagem em relação à concorrência lá fora, onde o estudante pode até chegar atrasado, mas as companhias têm uma área de treinamento muito forte, as universidades corporativas.
Como identificar esses talentos na empresa?
Talento, na realidade, é se fazer necessário. Não adianta ter doutorado se não for capital humano necessário para empresa. Por isso temos um desemprego mundial que ronda os 7% no mundo, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT). Dessa população desempregada, 44% é recém-formado, ou seja, não sabe fazer nada. Por isso que Harvard está criando uma empresa. Eles querem passar seus executivos por uma espécie de batismo de fogo no mundo corporativo. O gestor só aprende nas empresas. É aquela coisa, posso te dar um curso intensivo de natação, no qual você vai aprender tudo sobre o assunto, da manhã à noite, mas você só vai aprender a não se afogar na hora em que te jogarem na água. A mesma coisa é no mundo corporativo, ou você pratica, ou não aprende.
O senhor defende um novo líder ao qual chama de equilibrado e harmônico. Poderia definir melhor o conceito?
É aquele que abraça o princípio de “estar para servir”. Ele vai servir ao chefe (acima), ao subordinado (abaixo) e aos pares (que estão ao seu lado). Ele assina a "cruz organizacional". Se todos fizerem esse papel, a organização teria um timaço e ganha qualquer coisa, em qualquer mercado. Isso significa comunicar livremente (pra baixo, pra cima e para os lados), não ter medo nem de passar informação, nem de desenvolver pessoas (ele quer que o subordinado dele seja o melhor do mundo) e sempre ter um substituto, um sucessor à altura. É uma engrenagem em que um depende do outro. O grande líder é o que entende esse jogo.
É possível focar nas pessoas e nos resultados ao mesmo tempo? Não é utopia exigir do líder que ele consiga equilibrar tantos pratos?
Ele não tem outro caminho. Os jovens, agora, entram nas empresas sabendo exatamente o que querem e aonde querem chegar. Logo, pra ter um talento, preciso ter uma empresa parecida com esse público. Só assim consigo atraí-lo, retê-lo, motivá-lo e, por último, desenvolvê-lo. Não existe mais trabalhar sem ter as pessoas em mente. Faz parte da agenda de um CEO discutir pessoas. O tempo todo. E aquele líder que no passado dizia “manda quem pode, obecede quem tem juízo”, este está fora e não cabe mais no mercado. Eu não apresento um líder desses a um cliente.
Que líderes do mundo de hoje você citaria como exemplos?
Eu citaria o Jack Walch, ex-CEO da GE. No primeiro livro dele, tem um capítulo inteiro só sobre pessoas. Ele era, pra mim, o grande diretor de recursos humanos da companhia. No Brasil, um bom exemplo é o Jorge Paulo Lemann, sócio-fundador da InBev, que sabe como ninguém atrair, reter e motivar talentos. Por último, o Fábio Barbosa, ex-presidente do ABN AMRO Bank – era muito difícil tirar um executivo de lá na gestão dele. Ele é o líder espiritualizado, sem nenhuma conotação de religião, dentro do conceito que defendo de “estar para servir”. A busca da felicidade é o norte desses líderes. Pra você ser feliz, precisa ser usado na plenitude. Se tenho meu time feliz, ele rende muito. Esses caras sabem fazer isso. Eles são os caras que me inspiram.
Mas a InBev, por exemplo, é conhecida no mercado por recompensar e também exigir bastante de seus talentos, o que pode significar um ambiente hostil...
Quem é subutilizado acaba pedindo demissão e indo trabalhar em outro lugar. Se te dou a possibilidade de trabalhar e ser utilizado na plenitude, de conseguir fazer uma performance grande, de atingir seus resultados e te pago bem por isso, não vejo problema. E assim foi construída a InBev, por meio do desafio. Claro que é preciso ter equilíbrio na plenitude: não exigir a mais (senão a pessoa vai adoecer) e não exigir menos (se não ele fica desmotivado).
E quais as empresas que oferecem esse tipo de liderança, que proporciona a felicidade a seus talentos?
Normalmente uma grande empresa de sucesso tem espírito de liderança. De cabeça, listaria a Natura e a InBev. Claro que cada uma com sua cultura. A Natura tem uma proposta muito voltada pra qualidade de vida, valores e sustentabilidade. Já a InBev tem uma agressividade honesta: “eu sou assim, quer encarar o desafio comigo?” O funcionário da Natura não cabe na InBev e vice-versa.
O que o senhor diria aos líderes brasileiros, dentro desse novo cenário que desenhou?
Continue sendo o que é. Somos um povo miscigenado. Hoje, temos a educação, conseguimos nos fazer necessários, porque nos adaptamos a qualquer ambiente, em qualquer país. Atualmente, temos 5 milhões de brasileiros pelo mundo, desde jogador de futebol, passando por estudantes, gestores de alto nível, média gerência. E o brasileiro é bem visto e bem quisto, porque temos 144 cores diferentes de pele. Caminhamos para uma miscigenação cada vez maior. O tupiquim, que já foi mal visto no passado, agora é observado lá fora como “esse é o cara”.
Daniela Almeida
Fonte: http://epocanegocios.globo.com/Inspiracao/Carreira/noticia/2013/02/quer-ser-lider-aprenda-servir-ao-chefe-ao-subordinado-e-aos-pares.html acesso em 19 de fevereiro de 2013.
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