quinta-feira, 30 de agosto de 2012

É preciso decidir entre individualismo e coletivismo?


Em pesquisa com mais de 500 dirigentes empresariais, 30% afirmam que querem eliminar o traço de individualismo da cultura de suas organizações, enquanto para 45% suas empresas não têm nem desejam ter esse traço. Ou seja, 75% dos entrevistados não consideram o individualismo uma característica bem-vinda no ambiente organizacional. Ao contrário, seu desejo é incentivar a colaboração, o espírito de time e a força dos laços entre as pessoas. Para eles, o coletivo tem de ser mais valorizado do que o individual.
Outra parcela de dirigentes, correspondente a 14%, revela estar insatisfeita com a forma como esse traço é expresso e diz querer ressignificá-lo. Para eles, é preciso incentivar a responsabilidade de dono, valorizar o lado empreendedor de cada pessoa, mas não em detrimento do conjunto, pois "dono de verdade" sabe que precisa ter um time unido em torno de uma causa comum.
São duas as principais reflexões sobre os dados apresentados. A cultura brasileira é, em essência, mais coletivista do que individualista. Portanto, o desejo da maioria dos executivos converge para uma característica própria de nossa cultura e, assim, em princípio não encontraria resistência. Esse é o "lado sol" dos resultados da pesquisa.
Outra breve reflexão nos leva, no entanto, ao "lado sombra" da situação: até parece que os dirigentes que rejeitam comportamentos individualistas não são os mesmos que aprovam os modelos de gestão em suas empresas. As grandes diretrizes e políticas organizacionais, a exemplo da gestão de pessoas, adotadas no Brasil mostram isso. Quer um exemplo? A política de remuneração, uma das maiores e mais poderosas alavancas de transformação ou consolidação da cultura. Ela é uma expressão do que realmente é valorizado na empresa, através do estabelecimento de metas - e, aliás, até se remunera por isso.
Os modelos de "compensation", em sua grande maioria, tem uma lógica que privilegia o indivíduo e nem sempre de uma forma articulada com o conjunto. Aliás, na remuneração variável, por exemplo, para que a pessoa atinja a ousada meta estabelecida como indicador é necessário que, vez por outra, atrapalhe a meta do outro. É fato que, com isso, o resultado da empresa também pode ser afetado, mas o bônus pessoal é um drive muito forte. É bem verdade que em geral se estabelece para o time de dirigentes o resultado da empresa como um todo, o que nos levaria a compreender que essas políticas focam o coletivo. Não raramente, porém, mesmo no grupo cuja remuneração é ligada ao resultado global, não há clareza sobre como sua ação deve ser integrada à do colega ao lado. Incrível, mas ainda é assim que acontece.
Na maioria das vezes, esses modelos são inspirados nos utilizados nos Estados Unidos, de forma bastante consistente com o drive cultural daquele país: entre mais de 60 países, os EUA se destacam por seu alto grau de individualismo. Mas o Brasil, como sabemos, está localizado no eixo oposto. Não por acaso, as pessoas muitas vezes se sentem confusas e não se captura delas a melhor contribuição para o desempenho da empresa.
A tendência mostrada pela pesquisa é de privilegiar a ação coletiva, e o discurso dos dirigentes é claro no sentido de que as decisões devem se basear nesses princípios. Em contrapartida, a lógica que sustenta as políticas de remuneração praticadas, segundo a qual a avaliação do indivíduo é focada na garantia do bônus pessoal, tem fundamentalmente uma lógica individualista.
Você, dirigente brasileiro, tem uma questão importante a resolver, primeiramente consigo mesmo: afinal, o que você quer? Ao buscar a resposta, não deixe de levar em conta que é preciso alinhar o que você deseja com os famosos KPIs (Key Performance Indicators) e com os indicadores de remuneração variável. Importante se perguntar se eles são vinculados à estratégia da empresa de forma mais ampla. Ou em vez disso, privilegiam os resultados de curto prazo que cada um pode ajudar a alavancar. Uma combinação assim pode ser perigosa.

Betania Tanure



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