quarta-feira, 10 de abril de 2013

O que vinha e o que vem antes da ideia genial


Embora não se possa dizer que a publicidade é nova no Brasil, o modelo como a conhecemos, especialmente quem faz parte da geração mais nova no afã de lapidar ideias, não é assim tão velho: a clássica estrutura pautada no bastidor e na execução já começa a sofrer as alterações de um mercado cada vez mais exigente, que impele a indústria publicitária a incorporar novas etapas, antes, durante e depois de um processo de desenvolvimento. Entretanto, até os dias atuais, basicamente a etapa de planejamento, essa que ninguém além-agência vê – abrangendo aqui desde o atendimento até a criação das peças e ações – era o nascedouro das ideias brilhantes, das abordagens inovadoras, das grandes e valiosíssimas “sacadas”. Era.
Prática já adotada nos grandes polos publicitários e tendência implacável de mercado também para os centros e agências menores (onde em grande parte dos casos existe um agravamento da indisposição para investir em propaganda), o pré-teste surge como o divisor de águas num turbilhão de ressalvas dos clientes que tenta se sobrepor à expertise dos profissionais. Verbas restritas, mercado em recessão, ceticismo que leva ao culto à comprovação e justificação constantes, entre outras desculpas, fazem do pré-teste um dos novos queridinhos dos anunciantes, por ser ele uma ferramenta comprobatória (dúbia ou não) de que os conceitos outrora formidáveis podem ser, principalmente, rentáveis.
É aí onde reside o principal ponto de interrogação acerca dos pré-testes: afinal, eles são o altar ou o matadouro das grandes ideias? Se por um lado, pode-se analisar se o conceito proposto pelas agências garante afinidade e, consequentemente, boas perspectivas de resultados ante o público pretendido, por outro, leva-se a publicidade a um novo patamar de industrialização, mecanicidade e, principalmente, de cientificidade incapaz de tornar exata uma área que é humana por essência – insuscetível a regras.
O relacionamento entre agência e anunciante mediado pelos institutos de teste de conceito
Os pontos positivos e negativos do pré-teste
Mesmo com ferrenhas críticas, é oportuno indicar que a ferramenta apresenta seus prós e contras, possivelmente em jugo desigual, mas úteis o bastante para alarmar os que estão à frente de agências e anunciantes:
Crowdsourcing
Quando o conceito proposto pela agência é levado à experimentação, abre-se uma nova e importante possibilidade de lapidação de ideias: o público. É bem sabido que onde há gente palpitando aleatoriamente, há o risco de erro. Entretanto, onde há quem consuma, há quem possa suscitar possibilidades inauditas ou refutadas, que de tão óbvias tornam-se ignoradas – muitas vezes por uma equipe inteira.
A César o que é dele
O pré-teste também funciona como meio de validação das propostas da agência e que, mesmo sendo a pedra no sapato dos publicitários, atua como instrumento de verificação dos padrões adotados pela produtora e daqueles contemporâneos do mercado. É evidente que as grandes agências, por excelência e conhecimento, são menos suscetíveis a esse tipo de erro, mas para as que ainda não atingiram o suprassumo da experiência, os testes vêm à tona como uma epifania capaz de revelar aquilo que não se vê entre quatro paredes.
Argumento a quem quer argumento
Se a desculpa é a factibilidade daquilo que se propõe, o pré-teste atua como o mediador entre a necessidade de anunciar, as formas pelas quais isso é feito e o ceticismo do cliente. Para os mais apegados ao dinheiro e aos contratos, no fim das contas, serve ainda como garantia de vínculos. Uma vez que a ferramenta é uma apropriação grotesca das famosas praças-teste, largamente aplicadas no marketing, o pré-teste vem como o veredito das ideias geniais (ou pelo menos deveria vir, como abordado adiante) e uma fase intermediária entre aquilo que se espera que a campanha seja e o que efetivamente é.
O que deveria ser, nem sempre é
Exatamente pela imatura técnica dos pré-testes, o que há de positivo em sua aplicação torna-se um desafio que beira a incoerência, quando colocado à luz do mercado o fato de que os testes são feitos com esboços e não com os produtos finais do trabalho de uma agência. É como entregar milho cru para provar que pipoca com guaraná pode ser uma grande e memorável ideia. Metáforas postas de lado, não se pode provar que toda uma linha criativa é atraente e promissora, fazendo de cobaias os roughs que pouco ou nada têm a ver com as peças finais, estando, por isso mesmo, desprovidas da carga persuasiva e emocional que só essas últimas podem ter.
A rua e o lar são diferentes
Outro ponto que prejudica a utilização dos pré-testes é que eles não simulam nem representam o ambiente real de consumo de mídia do público e, por essa razão, pode apresentar índices significativos de desvios e erros interpretativos. O fenômeno ocorre por alguns motivos óbvios, dos quais pode-se elencar facilmente: a discrepância das afinidades do público com o meio e o produto anunciado em diferentes momentos do dia, as predisposições a consumir mídia e propaganda em tais momentos e, essencialmente, as percepções desfavoráveis que podem se formar a partir do consumo midiático/publicitário em momentos inoportunos.
Onde há teste, há risco...
...mas não é isso o que parece ser a cultura dominante entre aqueles que forçosamente requerem o pré-teste: a ferramenta é tida como garantia de sucesso para os cases que ultrapassem a marca da aceitabilidade mínima e, em via contrária, é interpretada como certeza de fracasso para as situações em que o teste (geralmente feito com esboços) não dê os resultados esperados. Na prática, não ocorre nem um, nem outro e o pré-teste, se não utilizado diligentemente, acaba sendo um mero antecipador de campanhas e, na pior hipótese, um meio de vouyeurismo das relações particulares entre agência e cliente.
É ainda cedo para se concluir acerca das melhores formas de utilização do pré-teste ou para o sentenciar como uma ferramenta ou um entrave para os anunciantes e agências. Como tudo o que é recente, há ainda muito a descobrir – especialmente pelos trendhunters cotidianos – até lá, vale a reflexão sobre a mutação da relação entre profissional, cliente e mercado.

João Valério

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