quinta-feira, 28 de junho de 2012

Economia Criativa, novas perspectivas em um mundo de transformação


Reza a lenda que uma indústria de pastas de dente começou a ter problemas com uma máquina desregulada. A cada tantas, a linha de produção despachava uma caixa sem o tubo de pasta dentro, para revolta de consumidores desavisados. Enquanto os engenheiros se digladiavam com a bendita máquina desregulada, um funcionário do chão de fábrica teve a iniciativa de puxar um ventilador para perto da linha de produção. Com o vento, as caixas vazias caíam e as cheias seguiam para serem embaladas.

Anedota ou não, a história joga sete pás de cal sobre a lógica da revolução industrial, em que alguns pensavam e muitos executavam. "Você é pago para fazer, não para pensar" era a máxima da época. Hoje, o mantra das instituições e da economia passou a ser "criatividade". Indústrias criativas, economia criativa, classe criativa, cidades criativas... No entanto, se criatividade sempre foi importante, por que agora se tornou o centro de nossas atenções?

Bem, porque o mundo mudou. Vários desses sintomas estampam as manchetes dos jornais: desindustrialização, fragmentação das cadeias de produção, defesa dos direitos de propriedade intelectual. De fato, nos últimos 20 anos, a convergência entre globalização e mídias digitais catapultou a uma velocidade vertiginosa as transformações econômicas, sociais e culturais e fez com que bens e serviços parecessem cada vez mais semelhantes. Como diferenciá-los e como fazer com que empresas e economias se tornem mais inovadoras e competitivas?

Historicamente, alguns fatores jogaram a favor disso. Um deles era o capital, o dinheiro de que um país dispunha. As grandes navegações foram financiadas pelos ricos empreendedores dos países exploradores, aliados às suas coroas. Nos dias atuais, ter empreendedores ricos não significa que o país saia em vantagem. Afinal, com um clique de computador as companhias e os investidores enviam ou repatriam dinheiro de todos os cantos do mundo.

Outro alicerce de competitividade das economias sempre foi a tecnologia. Mas, se antes uma inovação garantia a segurança de seu inventor por vários anos, atualmente basta lançarmos um produto para que a concorrência responda com outro, pouco tempo depois. Capital e tecnologia passaram a ser muito facilmente transferíveis no palco mundial.

Como sair dessa sinuca? É aí que entra a economia criativa, reconhecendo que um ativo que nem sempre foi tido como importante passa, agora, a ser simplesmente fundamental: a criatividade. Não somente a criatividade de artistas e cientistas, porém, a criatividade de todos os que trabalham em uma organização ou vivem em uma sociedade. É aí que a lenda relatada acima vem à baila. Hoje, ouvir e reconhecer as ideias dos colaboradores de uma empresa, da comunidade do entorno, de seus fornecedores e clientes não é mais uma questão de bom relacionamento ou de responsabilidade social corporativa e, sim, uma questão de conseguir ou não inovar e se diferenciar.

Antes que me tachem de romântica, chamo em minha defesa o Creative Economy Report 2010, da UNCTAD, ou estudos nacionais mais recentes, desenvolvidos pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) e pela Fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap), a pedido da Prefeitura de São Paulo. Notem: ONU, empresariado e governo, em diferentes cantos do mundo, todos voltando seu olhar para um mesmo tema. E não é por menos. Os setores criativos (um misto de cultura e tecnologia) representam em média 7% do PIB mundial, são os que mais rapidamente crescem na economia, são intensivos em emprego e tendem a aborver um grande contingente de jovens. Mais do que isso, têm o potencial de dinamizar setores tradicionais da economia, libertando-os da maldição de competir por preço.

Tomemos como exemplo um setor criativo em específico, a moda brasileira, internacionalmente reconhecida por ser arrojada e diferenciada. Com uma moda assim, a indústria têxtil encontra uma brecha para criar e oferecer tecidos inovadores, deixando de brigar por preço com tecidos padronizados; e, da mesma forma, a indústria algodoeira tem novos estímulos para inovar, para apoiar o desenvolvimento da indústria têxtil diferenciada. Moral da história: os setores mais criativos de uma economia, chamados de "indústrias criativas", produzem um efeito dominó da criatividade em toda a economia, constituindo a chamada "economia criativa".

Ora, se o brasileiro é criativo, a economia criativa é verde e amarela, certo? Depende. Criatividade não se concretiza em inovação por combustão espontânea. Ter talentos capazes de impulsionar uma economia criativa exige ao menos duas ordens de investimentos: em ciência e tecnologia, para que tenham acesso a dados e informações em tempo real, na arena global; e em educação, para que sejam capazes de, com senso crítico, transformar essas informações em conhecimento.
Momentos de mudanças de perspectivas, como o que estamos vivendo, podem fazer a diferença entre resolvermos problemas estruturais de nossa sociedade ou reforçá-los no futuro. Aproveitemos essa oportunidade para pensar no que queremos. E em como podemos transformar nossa criatividade em prosperidade.

Ana Carla Fonseca


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