As mulheres estão empreendendo mais cedo, em maior número e em áreas
diversificadas. Entre 2002 e 2013, a participação das empreendedoras em
pequenos negócios com até três anos e meio de atividade cresceu dez
pontos percentuais. Enquanto a parcela de homens caiu de 57,6% para
47,8%, a liderança feminina no setor saltou de 42,4% para 52,2%, no
mesmo período, segundo o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
(Sebrae).
"A maior parte das proprietárias tem entre 40 e 64 anos de idade, mas
a participação das mais jovens também aumentou", afirma o presidente do
Sebrae, Luiz Barretto. "Quarenta e um por cento do público feminino que
está montando uma empresa hoje têm entre 18 e 39 anos e cerca de 40%
delas são chefes de família", diz. A maioria, ou 70% do total, tem, ao
menos, um filho.
Segundo Barretto, no início da década passada, a prestação de
serviços e atividades de comércio, como lojas de roupas e acessórios,
concentravam 80% das companhias comandadas por gestoras. Hoje, mais
capacitadas e escolarizadas, as empresárias aparecem com iniciativas
também na indústria e marcam maior presença no agronegócio. A proporção
das empreendedoras com firmas de serviços alcança 32,6%, seguida do
comércio (31,2%) e indústria (18,7%). "Em 2001, 9% das donas de
empreendimentos estavam no campo. Dez anos depois, essa participação foi
para 11%."
As atividades preferidas das mulheres no setor de serviços são
trabalhos ligados a salões de beleza, alimentação e saúde. No comércio,
predomina a venda de vestuário e calçados, enquanto na indústria o
destaque é a confecção de roupas. "Uma das principais mudanças no perfil
das empresárias é que elas não empreendem mais apenas para complementar
a renda familiar ou por passatempo", analisa Barretto. "A maioria
identifica uma demanda de mercado e coloca essa ideia em prática, com
planejamento."
Foi o que aconteceu com a paulista Cristina Ruffo, de 60 anos,
considerada uma das maiores criadoras de jacarés de papo amarelo do
mundo, com um plantel de cerca de 20 mil animais, em Maceió (AL). As
peles manufaturadas são vendidas para fábricas de carros como Ferrari e
BMW. Antes de se estabelecer, Cristina trilhou um longo caminho. Foi
jornalista e dona de empresas de recursos humanos. Aos 34 anos, com uma
vida atribulada, sofreu um infarto e resolveu se mudar para o Nordeste,
em busca de dias mais sossegados.
"A situação era difícil. Estava recém-infartada, separada e com três
filhas menores de 12 anos, em uma nova cidade", lembra. O pulso firme
fez com que, em menos de um ano em Maceió, abrisse um restaurante.
Conheceu o atual marido, o italiano Silvio Garabuggio e, um ano depois,
já tinha quatro estabelecimentos. O gosto do companheiro pela pesca
levou o casal a comprar uma propriedade no entorno da capital alagoana
para criar os peixes que seriam servidos aos clientes. Em uma das
pescarias, encontraram três jacarés. "Vi surgir uma oportunidade de
negócio, com a venda de subprodutos do animal."
Para entender mais sobre o assunto, Cristina visitou criatórios na
Austrália, Ásia e Estados Unidos. "A burocracia era muito grande para
legalizar o negócio no Brasil", diz. "Foram anos de trabalho sem
retorno, pois ainda não estava autorizada a vender." As entregas da
empresa, batizada de Mr. Cayman, só começaram em 2002. Oito anos depois,
ela era a pioneira no Brasil em criatórios no sistema "farming" e no
abate humanitário dos animais. Conseguiu também tirar os bichos da lista
de espécies em extinção no Brasil. Há dois anos, obteve a permissão
para exportar as peles.
Com seis funcionários, que incluem as três filhas e um neto de
Cristina, a Mr. Cayman produz 200 peles ao mês, vende animais vivos para
o início de novos negócios e hospeda espécies para criadores em
processo de licenciamento. O faturamento mensal chega a R$ 160 mil. Em
2012, por conta de seu trabalho, a empresária venceu o Prêmio Mulher de
Negócios do Sebrae, criado em 2004 para reconhecer histórias de
empreendedorismo feminino.
Em breve, Cristina vai inaugurar um complexo com 15 criatórios, com
80 animais cada um, em uma área de um hectare. Serão vendidos por cerca
de R$ 1 milhão. O local vai ter uma escola-oficina para a confecção de
produtos, um hotel e um restaurante especializado em carne de jacaré.
"Cada vez mais mulheres preparadas, que fizeram carreira em empresas,
deixam o mundo corporativo para empreender", observa Maria José
Tonelli, vice-diretora acadêmica da Escola de Administração de Empresas
de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV-Eaesp) e coordenadora no
Brasil do Programa 10.000 Mulheres, de educação em administração e
gestão de negócios. "O empreendedorismo dá uma maior flexibilidade para
conciliar carreira e vida familiar, permitindo acompanhar de perto a
educação dos filhos."
No caso de Gislaine Marcandali, 54 anos, dona da Lavatórios Portáteis
Volare, o sucesso do empreendimento a ajuda a sustentar a casa. Chefe
de uma família de três filhos, começou como funcionária em salões de
beleza antes de abrir seu próprio estabelecimento, em 1986.
Em 2007, procurou o Sebrae que, em parceria com o Instituto de
Pesquisa e Tecnologia (IPT), criou um lavatório portátil de fibra de
vidro. Hoje, a empresa vende três modelos de lavatórios, com uma
produção mensal de 20 unidades. Em breve, lança uma quarta versão, para
pessoas acamadas ou com mobilidade reduzida. "A ideia é aumentar a
produção para 400 peças ao mês, a partir de abril", diz. O modelo mais
barato custa R$ 1,3 mil e ela fatura cerca de R$ 20 mil ao mês.
Fonte: Valor, acessado em 28 de Fevereiro 2014.
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