terça-feira, 10 de dezembro de 2013

'QUANDO O FUNCIONÁRIO SE COMPORTA MAL, A CULPA É QUASE SEMPRE DA EMPRESA'

Silvana Lages, consultora de imagem (Foto: Divulgação/Silvana Lages)
O sujeito chega à festa de final de ano da empresa. Traz a família toda e, pelo que parece, vieram com um só objetivo: esbanjar. Bebida numa mão, comida na outra, faz uma brincadeira com a esposa do chefe, “a patroa”, depois olha para o supervisor e pergunta sobre aquele aumento prometido há tempos – “quando é que vai sair?”. Vira amigo do barman, bebe cerveja, uísque e caipirinha, dança até cansar. É o último a ir embora, carregado pela esposa, e ainda sai reclamando que o ambiente poderia ser mais espaçoso. Parece exagero, mas esse tipo de comportamento é mais comum do que se pensa nas festas corporativas. Se não fosse, a agenda de Silvana Lages, especialista em etiqueta corporativa, seria bem menos apertada.
Consultora de empresas como Fiat, Unimed, Correios e Banco do Brasil, Silvana tem entre seus trabalhos justamente explicar a funcionários e equipes o objetivo dos encontros corporativos. “Por se tratar de uma festa, muita gente acaba se comportando como se estivesse num encontro de amigos ou familiares, porém se trata de trabalho. É um ambiente mais descontraído, mas ainda sim, trabalho”. Mas não dá para culpar sempre o funcionário. Depois de 11 anos atuando na área, a especialista defende que as as atitudes “abusivas”, como as do sujeito descrito acima, são muito mais culpa da companhia do que do próprio empregado.
Em entrevista a Época NEGÓCIOS, a consultora explica qual a importância de manter uma imagem sóbria e profissional em todo tipo de ambiente – e ainda dá dicas de como se comportar na festa de final de ano.
Qual o grande erro dos funcionários nas festas corporativas?
É o excesso de intimidade. Nesses eventos, a hierarquia da empresa é deixada de lado. O presidente, o diretor, o supervisor e o funcionário estão todos no mesmo patamar. Isso é até intencional por parte da empresa para dar uma sensação de time, de equipe. É uma boa oportunidade para fazer contatos, conhecer outras áreas. Mas muita gente acha que, porque o chefe está ali, tomando cerveja ao lado dele, pode fazer brincadeiras ou mostrar alguma intimidade. Chega dando tapinha nas costas, chamando pelo primeiro nome, perguntando sobre a “patroa”. Quando isso acontece, a outra parte pode se sentir ofendida ou achar aquele determinado funcionário impertinente. O chefe começa a se perguntar como aquele sujeito se comporta quando vai para algum evento representando a empresa. Já vi histórias assim acabarem até em demissão.
Qual seria, então, uma abordagem apropriada para conversar ou se apresentar a um superior?
Para começar, nunca fique com as duas mãos ocupadas com bebida ou comida. Tenha sempre uma mão disponível para cumprimentar alguém. Também tenha um cartão no bolso. Depois, veja um momento oportuno, em que ele não esteja conversando e se apresente. Pode ser bom também elogiar alguma conquista da equipe aquele ano, dizer algo como “parabéns por ter atingido esta meta, foi um trabalho muito bom”. Em seguida, sugira um café ou um encontro. Quando ele concordar e se ele não disser mais nada, diga que foi um prazer e se afaste. É muito ruim falar de negócios nesses momentos, por isso você tem de tratar desse assunto de uma maneira leve, especial.
E se você for a pessoa abordada de maneira imprópria?
Você tem que levar a situação com muito humor, com muita leveza. Sorria, cumprimente, agradeça e se afaste quando for possível. Tem que ter jogo de cintura. Aquele é um momento do chefe também ser profissional. Ele tem de ser simpático e educado com a equipe, afinal, ele é exemplo.
Qual o objetivo das festas organizadas pelas empresas? O que elas esperam do funcionário na ocasião?
É renovar forças, comemorar resultados, entrar no próximo ano com as energias renovadas. Mas, veja bem, não é só uma questão de diversão. É uma boa oportunidade para fazer contatos, plantar sementes para o próximo ano. Não é o local para comer e beber e ficar conversando com as mesmas pessoas que você conversou o ano todo. É uma hora de confraternização.
E no caso das empresas mais informais, como startups? Essas regras também valem?
É claro que você pode criar um ambiente informal, sem muitas solenidades. Mas não dá para abusar, ainda mais quando a empresa ainda está começando. Pense no Mark Zuckerberg, por exemplo. Dificilmente ele andaria por aí com cartões corporativos ou pensando em fazer contatos para o próximo ano. Mas ele já é o CEO de uma empresa de muito sucesso. Ele pode se dar ao luxo de dispensar solenidades.
Não existem regras que valham para todas as empresas, mas percebo que o grande erro hoje das pessoas é confundir informalidade com intimidade. A empresa pode ser informal  e não ter muita sonelidade, mas isso não significa intimidade. O excesso de intimidade é o maior erro das festas. Em todos os ambientes, dos mais formais aos mais flexíveis, precisa ter limite, adequação.
Com quais fatores a empresa deve ficar atenta para que não ocorram problemas nesses encontros? 
A empresa tem que pensar muito bem na hora de planejar um evento. Tem de especificar bem qual é o tipo de festa, o traje que deve ser usado. Sem esquecer jamais que se trata de um ambiente de trabalho. Precisa ser um ambiente formal, mesmo sendo uma festa.
Já vi casos em que empresa marca uma festa na piscina e diz para os funcionários levarem traje de banho. Isso é muito errado. Não é adequado o chefe ver a funcionária de maiô ou vice-versa. É preciso tomar cuidado com a imagem e não deixar o ambiente se tornar íntimo demais. Quase sempre um evento assim vira problema depois. Na maior parte das vezes em que um funcionário se comporta de maneira inadequada, a culpa é da empresa.
Como assim?
Porque elas não explicam o que querem. Elas não são claras sobre o que elas pensam e querem do comportamento dos empregados. Se alguém foi com uma roupa inadequada à festa de final de ano é muito provavel que a empresa não tenha especificado o traje ideal para o evento no convite, por exemplo.
E isso não ocorre só em festas corporativas. Ocorre o ano todo. Percebo que existe uma cobrança das companhias para que os funcionários se comportem e se apresentem melhor. Mas elas não instruem direito. Esses assuntos não são assuntos para você falar só uma vez por ano. É preciso usar a comunicação interna, e-mails corporativos para mostrar a importância da imagem dos empregados. Eles representam a empresa. E a imagem é um bem que você precisa lapidar, gerenciar, tomar conta. Tenho a impressão de que as empresas acham que com um workshop de um dia, tudo muda. Mas leva muito mais tempo do que isso.
Existe também uma questão de exemplo dentro da empresa?
Sim. Muitas vezes chego a uma empresa e ouço o superior enumerar uma série de comportamentos inadequados de seus funcionários: a roupa, a maquiagem, a maneira de comer, a maneira de atender. Mas depois percebo que ele faz tudo isso de maneira imprópria também. Ele é o exemplo negativo. A liderança, a direção devem criar um exemplo a ser seguido.
E é muito difícil mudar o comportamento dos funcionários numa empresa? Como fazer para se adequar ao ambiente corporativo?
Mudar comportamento é algo muito difícil, por isso precisa ser um investimento de longo prazo.
Quando entramos em uma empresa, precisamos representar a imagem, a figura dela no mercado. Temos que fazer parte do todo. Não dá para impor o seu estilo. O coletivo deve prevalecer. Se você não se adequa a um determinado tipo de empresa mais informal ou mais formal, você tem de encontrar outro local que você se sinta melhor. Você precisa procurar trabalhar em empresas que estejam de acordo com o seu eixo.
Outra opção é criar um personagem que você tenha facilidade de usar. Por exemplo, se o seu ambiente de trabalho é muito introvertido e você é uma pessoa extrovertida, você precisa saber que deve se comportar de uma maneira completamente diferente lá. Criar um personagem mesmo. Não é o mais adequado, mas você tem mais chances de ser feliz. Lembrando que, quando você cria um personagem, quem vai a festas corporativas é ele e não você.
5 dicas rápidas para se não fazer feio na festa da empresa
Que roupa ir? O quanto pode comer ou beber? Que horas vou embora?  (Foto: Think Stock)

Horários: "seja pontual na chegada e, de jeito nenhum, seja o último a sair. Alguns funcionários querem aproveitar até o último minuto, mas esse não é o tipo de festa que você pode escolher ir embora só quando acaba. Você é um funcionário ali, por mais descontraído que o evento seja".
Comida e bebida: "você já deve ter comido alguma coisa antes para não abusar de nenhum dos dois. Controle muito bem o que você bebe e saiba qual o seu limite para não fazer feio. Não ocupe as duas mãos com os comes e bebes. Deixe sempre uma mão livre para cumprimentar pessoas".
Amigo oculto: "siga o valor estipulado do presente, mesmo que você tenha tirado o presidente da empresa. É uma brincadeira, um momento de confraternização. Se você comprar um presente muito caro vai parecer que está puxando o saco. Também tome cuidado com o discurso na hora de anunciar quem você tirou. Às vezes a pessoa quer ser engraçada e acaba falando de alguma característica que pode ser encarada como uma ofensa: 'o careca', 'a dona encrenca', 'a bonitona', 'o barrigudo'. Tem de tomar cuidado para não ir muito para o lado positivo e nem para o lado negativo. As pessoas podem ficar constrangidas".
- Roupas: "se vista de maneira confortável, conforme o tipo da empresa em que você trabalha. Nunca deixe para estrear uma roupa ou um sapato novo em festas. Pode ser que o sapato acabe machucando seu pé ou a roupa tenha algum defeito e você não poderá fazer nada para arrumar na hora".
- Redes sociais: "com os smartphones, as pessoas tendem a viver muito mais no mundo virtual do que no real. Ficam tirando fotos, checando o Facebook e perdem a oportunidade de estar ali naquele momento. Também tome cuidado com as fotos que posta da festa. Não publique nada que possa constranger algum colega e não marquem todos os que aparecem nas fotos que você tirar".

Nenhum comentário:

Postar um comentário