Qualquer candidato que se diga bem preparado para uma entrevista de trabalho precisa estar afiado para perguntas sobre suas habilidades sociais e, especialmente, sobre sua capacidade para trabalhar em grupo. E quando o assunto é a qualificação individual a pressão nesse caso é ainda maior. Ou seja: exige-se o "melhor entre os melhores", tanto no específico como no coletivo. É como se o sucesso da empresa dependesse exclusivamente de captar os melhores talentos e colocá-los para trabalhar em grupos. Mas será que é isso mesmo? Qual deve ser o papel das políticas empresariais para extrair o melhor de seu capital humano e qual a vantagem do trabalho em grupo, acima de tudo?
Ora, muitos advogam que o pensamento coletivo é mais eficaz que o individual. Um defensor desse princípio foi Sir Francis Galton, um antropólogo britânico obcecado por números. Galton ficou famoso com uma experiência feita por ele durante a feira inglesa do boi gordo de 1906. A experiência ocorreu durante um concurso onde oitocentas pessoas tentavam estimar o peso de um boi em exposição. Cada pessoa colocou sua estimativa numa urna e aquele que conseguisse acertar o peso do bovino ganharia um prêmio. Ninguém acertou, mas Sir Galton, astuto, usou as estimativas dos oitocentos participantes e, sob um tratamento matemático, chegou ao valor exato: 544kg.
Recentemente, a mesma experiência foi realizada na internet por um grupo de matemáticos britânicos que recriou a ideia de Galton trocando o boi por uma foto de um pote com balas de goma. Neste caso, os internautas deram muitos palpites, mas, como em 1906, ninguém se aproximou tanto do número exato quanto os matemáticos que fizeram uma estimativa baseada nos dados “incorretos” de cada indivíduo dentro da multidão. Ou seja, estimativas imprecisas colocadas num contexto coletivo podem nos ajuda a calibrar nossas previsões. É como se o coletivo possuísse, na soma de suas partes incorretas, uma inteligência inata … A "sabedoria das multidões“.
Outro exemplo da tal "sabedoria das multidões“ ganhou notoriedade com o programa televisivo "Quem quer ser milionário“. Observações demonstram que mais de 90% das respostas dadas pelo auditório são corretas, contra apenas 65% das respostas dadas pelos especialistas chamados pelo telefone pelo candidato. Em outras palavras, se dependêssemos apenas dos HIPPOs (highest paid person’s opinion), os Beatles estariam sem um contrato, Harry Potter e Star Wars não haveriam chegado ao cinema (que, aliás, ainda seria mudo) e apenas cinco computadores haveriam sido vendido em todo o mundo.
Pelo visto, enquanto especialistas erram pênaltis, a multidão está marcando gols, como no caso da Wikipédia, o Firefox e o sistema operacional Linux, produtos e serviços criados sob plataformas participativas, onde milhares de aportações individuais criaram uma espécie de organismo dinâmico e inteligente.
A tudo se aplica?
Mas será que há linearidade nesse raciocínio? Será que um bando de macacos colocados numa sala com lap-tops seria capaz de compor um best-seller? Será que os 200 passageiros de um avião dariam conta do recado na falta do piloto? Não, infelizmente não é bem assim, como demonstram os resultados de muitas eleições democráticas.
Para James Surowiecki, autor do livro "A sabedoria das multidões“, além das qualificações individuais, existem certas condições primordiais para dar certo. São elas:
A diversidade de opinião - Os diferentes indivíduos do grupo devem dispor dos fatos para analisá-los livremente sobre sua própria ótica. Um grupo saudável necessita de opiniões diferentes, vindas de pessoas diferentes.
Independência - Membros do grupo devem analisar os problemas e gerar opiniões sem fontes externas de pressão que possam influenciar negativamente suas decisões. Para isso, as metodologias e idiossincrasias dos participantes devem ser respeitadas.
Descentralização - Manifestações de concentração de poder e estilos ditatoriais bloqueiam as vantagens adquiridas pela independência e diversidade do grupo. E, além de bloquearem a evolução da inteligência, reduzem a motivação diante de novos desafios.
O cientista social Thomas W. Malone, diretor do Centro de Inteligência Coletiva do MIT (Massachusetts Institute of Technology), defende outros dois fatores para se cultivar a inteligência corporativa: as mulheres e os supercomputadores! Sim, segundo ele, a presença feminina é fundamental para contrabalancear o domínio masculino e aumentar a diversidade de opiniões do grupo. Já os supercomputadores, por outro lado, constituem uma peça-chave para gerenciar as experiências e o gigante volume de informações adquiridas pelo grupo.
De acordo com Malone, simulações contextuais baseadas nas informações disponíveis nas próprias empresas e nos 5 milhões de terabytes disponíveis na internet ajudaram a melhorar nossas previsões da mesma forma que Sir Galton fez em 1906.
Um bom exemplo desse conceito foi apresentado por Ginni Rometty, CEO da IBM no evento "Cidades Inteligentes", que ocorreu no Rio de Janeiro, em 2011. Segundo ela, a drástica redução da violência em Nova Iorque se deve, em parte, ao fato de a polícia nova iorquina dispor de um algoritmo que trabalha com 33 bilhões de dados (dados pessoais, endereços, pistas etc.) e os detalhes de mais de 120 milhões de ocorrências em seu supercomputador. Segundo ela, todos esses dados têm ajudado a polícia a desvendar crimes e a prever ações criminosas antes de elas acontecerem.
Um outro exemplo vem da Espanha. A Zara, a empresa do setor da moda, tem usado sua inteligência coletiva em prol da competitividade. Neste caso, suas 1670 lojas estão conectadas diretamente com seu estúdio de criação e os dados fornecidos de forma online ajudam os estilistas a interpretar quais tendências devem (ou não) ser descontinuadas.
Pelo visto, no futuro, a balança de poder para as empresas já não usará a produtividade, mas uma espécie de “coeficiente de inteligência corporativa” para definir quem é o melhor.
E, em tempo de redes sociais, os talentos individuais aparentam perder força para centenas de participantes desconhecidos, mas muito eficientes. Enquanto isso, o conceito clássico de trabalho em grupo fica sem valor se o grupo não souber abstrair, aprender, calcular e, sobretudo, se não tiver a capacidade de prever e resolver problemas de forma rápida e eficiente.
Quem sabe um dia chegaremos a ter um ranking de QI para empresas. Governos e times de futebol já estão convidados.
Adriano Morozonni
Fonte: http://www.administradores.com.br/artigos/carreira/somar-inteligencias-individuais-nem-sempre-resulta-em-inteligencia-coletiva/72682/ acesso em 02 de Setembro de 2013
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