Existem inúmeros produtos e modelos previdenciários mundo afora. Fundos de pensão, planos abertos de previdência, contas individuais… Planos particulares, patrocinados por empresas, pelo governo, híbridos… Diferentes modalidades de diferimento ou incentivos fiscais… Mas, com relação ao benefício recebido (que é aquilo que nos interessa – “dindim no bolso”), todos os planos e modelos previdenciários podem ser enquadrados em duas grandes famílias: os planos de BENEFÍCIO DEFINIDO e os de CONTRIBUIÇÃO DEFINIDA.
Antes de prosseguir, quero avisar que vou abordar as características desses planos e seus riscos de forma altamente superficial, pois previdência é um assunto tão enroscado que eu poderia escrever uma enciclopédia e ainda assim iriam faltar coisas. Por isso, se você, leitor, for um atuário ou profissional especializado no assunto, por favor pare de ler pois este artigo não é para você (ou então me dê o devido “desconto”). Mas voltando às explicações…
PLANO DE BENEFÍCIO DEFINIDO
Um plano de benefício definido é aquele em que você contribui e, quando se aposenta, passa a receber seu benefício como se fosse um “salário” até o fim da vida (na maioria desses planos, mundialmente falando, o benefício é vitalício, por isso assumiremos isso como regra geral).
A aposentadoria pública no Brasil (e em grande parte das economias ocidentais) segue o modelo de benefício definido, onde você contribui com determinado valor por “X” anos e, quando se aposentar, vai receber o benefício mensalmente. Você poderá receber mais ou menos que o valor que contribuiu ao longo da vida. Por exemplo, se você se aposenta aos 60 anos e morre aos 61, você acabou aproveitando muito pouco daquilo que contribuiu e o dinheiro que restou vai para… Bem, deixa pra lá. Em um cenário assim você é um “azarado”, pois pagou e não recebeu.
Mas vamos supor que você se aposente aos 60 anos e, por conta de sua genética privilegiada, viva até os 100. Você vai passar 40 anos recebendo um benefício mensal equivalente a um salário e é pouco provável que a soma de suas contribuições ao longo do período ativo supere a soma daquilo que vai receber como benefício previdenciário. Nesse cenário, então, você é um “sortudo”, pois vai receber mais do que pagou.
PLANO DE CONTRIBUIÇÃO DEFINIDA
Neste tipo de plano, você contribui com um determinado valor que você define (daí o nome). Esse dinheiro será investido no mercado financeiro para “crescer” e formar um patrimônio. O valor da sua aposentadoria será limitado ao valor desse patrimônio. Não há, grosseiramente falando, a possibilidade de você receber mais dinheiro do que aquilo que acumulou e foi capitalizado no mercado financeiro.
Nesse tipo de plano, o beneficiário arca com uma série de riscos. O primeiro e mais óbvio é o risco de viver além daquilo que o patrimônio acumulado permite. É mórbido e meio desconcertante tentar estimar a data da própria morte, mas quem está em um plano de contribuição definida precisa pensar nisso. Outro grande risco é que o mercado financeiro, onde o dinheiro será investido, não se comporte como planejado e o patrimônio não cresça como previsto ou, pior ainda, sofra uma diminuição em termos reais, pois os retornos podem não ser suficientes sequer para compensar o efeito da inflação.
Entendendo o funcionamento básico desses dois modelos, acho que fica bastante claro que, do ponto de vista do beneficiário, o melhor modelo é o de benefício definido. No plano de benefício definido os riscos dos retornos do mercado financeiro e da longevidade (lembram da “armadilha de Bismarck” da primeira parte deste artigo?) são arcados pelo mantenedor do plano, seja o governo, os empregadores (através dos fundos de pensão) ou as empresas que administram planos de previdência abertos.
Porém, há um problema: o que acontece quando esses dois riscos se tornam duas certezas? A expectativa de vida não para de subir e, a qualquer momento, algum cientista maluco em algum lugar do mundo pode aparecer com alguma fórmula que faça nossa expectativa de vida dobrar da noite para o dia.
Já do ponto de vista do mercado financeiro, não há nenhuma garantia que ele dará retornos grandes o suficiente para que o patrimônio de todos os contribuintes cresça. O dinheiro dos contribuintes precisa ser investido em algo para crescer pois, como sabemos, dinheiro não dá em árvores. Esse “algo” são ativos diversos, que podem ser títulos de renda fixa, ações, imóveis, commodities, empresas de capital fechado e o que mais conseguir imaginar. Só que não há como saber se o retorno desses ativos financeiros será o suficiente para dar conta das necessidades dos aposentados no futuro. No Brasil, inclusive, por conta das quedas nas taxas de juros, os retornos dos planos de aposentadoria estão tendo que ser revisados (para baixo) e isso é uma má notícia para quem vai se aposentar.
As pessoas vivem mais, o dinheiro não “cresce”… E agora, quem vai pagar essa conta?
Os sistemas públicos de seguridade social (no Brasil e em muitos países, inclusive nas ditas “economias desenvolvidas”) deveriam, em tese, aplicar o dinheiro no mercado financeiro, mas, na prática, acabam usando o dinheiro dos contribuintes atuais (que ainda estão na “ativa”) para financiar o benefício dos aposentados. Isso, de certa forma, acaba mitigando o risco do mercado financeiro, mas só funciona se tivermos um grande número de pessoas entrando no sistema para “pagar a conta” de uma massa cada vez maior de aposentados que vivem por muito mais tempo.
Por conta dessa prática, alguns mais cínicos se referem ao sistema de previdência pública como “o maior esquema Ponzi do mundo” (o que não deixa de ser verdade…). Esse modelo obviamente tem um grave problema de sustentabilidade econômica mas, pior ainda, tem um problema se SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL; afinal, gostaria de lembrá-los que já somos mais de 7 bilhões de habitantes no mundo consumindo, poluindo e destruindo. Até quando vamos continuar com um sistema que precisa constantemente de “carne nova” em quantidades cada vez maiores para funcionar?
Temos então o risco da longevidade, os riscos do mercado financeiro e agora até mesmo riscos ambientais para “temperar” essa conversa. A capacidade do sistema de absorver e gerenciar esses riscos está se tornando cada vez mais limitada, principalmente pelo fato de eles estarem deixando de ser riscos para virarem “fato consumado”.
A única forma do sistema não ruir nessas condições é tentando, de alguma forma, “empurrar” esses riscos para o indivíduo. E assim começa uma nova era de responsabilidade individual.
André Massaro
Fonte: http://exame.abril.com.br/rede-de-blogs/voce-e-o-dinheiro/2013/01/22/a-nova-era-da-responsabilidade-individual-parte-2/ acesso em 23 de Janeiro de 2013.
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