Autor de diversos livros na área de Administração e Negócios e consultor de empresas, Fábio Zugman sobre os desafios de empreender. Ele destaca as principais dificuldades para quem está começando, dá dicas sobre como procurar suprir as carências e comenta a concorrência entre o mercado e o funcionalismo público por talentos. Enfim, ele aponta alguns caminhos das pedras para empreender com sucesso. Mas deixa claro: como chegar ao destino final depende de cada um.
Quais as dificuldades mais comuns em empreendedores iniciantes?
O primeiro problema, insegurança, começa até mesmo antes de a pessoa começar. Empreender sempre é algo com um alto grau de incerteza. A pessoa pode precisar abrir mão de um emprego para se dedicar ao novo empreendimento, pode investir suas economias e por tudo a perder, até contrair dívidas etc. O medo do desconhecido costuma incomodar. O problema é quando ele se torna tão grande que nos paralisa. O truque para lidar com isso é pensar em até que ponto, realmente, as coisas que damos como "certas" são tão certas assim. Alguém pode achar que está seguro em um bom emprego e ser despedido no dia seguinte, ou ter investimentos em imóvel sonhando ganhar uma renda com locação e ver uma crise financeira aparecer. É claro que os primeiros anos de um empreendimento possuem um risco maior, mas – colocando as coisas sob perspectiva, se o negócio for bom, o potencial de ganhos nos convence a seguir em frente.
O segundo é se organizar. Sempre digo que o maior problema do empreendedor é quando ele acha que empreender e administrar é passar o dia inteiro correndo, resolvendo coisas e apagando incêndios. Essa situação é piorada por frases como "vou deixar de ter chefe", "vou ser dono do meu nariz" e assim por diante. A verdade é que uma boa administração é justamente aquela que coloca uma boa rotina para lidar com o dia a dia da empresa. Um bom administrador é o que estabelece uma boa rotina para as coisas andarem sem atritos e resolve problemas conforme eles aparecem. Então aprender a estabelecer uma rotina é algo importantíssimo.
O terceiro é ter energia e uma boa ética de trabalho. Toda a inteligência e técnicas do mundo não servem de nada se a pessoa se deixar abater pelos primeiros problemas ou tentar ignorar os problemas que começam a aparecer, em vez de ir ao encontro deles para resolvê-los. Problemas vão aparecer, e é preciso uma boa força de caráter para lidar com eles de forma franca e pragmática.
Por último, muitas pessoas querem empreender porque gostam de fazer algo, mas não examinam o mercado desse "algo". A verdade é que hoje em dia há consumidores para quase tudo que você resolve produzir, mas você precisa saber onde os consumidores estão, o quanto eles podem e estão dispostos a pagar, e como você deve adaptar seus produtos e serviços para atendê-los da melhor forma possível.
Do ponto de vista da Administração, o que um empreendedor iniciante deve buscar para suprir suas deficiências (Curso? Especialização? Conversar mais com os clientes?)?
Para o pequeno empreendedor, o contato com o cliente é indispensável. A verdade é que para grandes empresas, isso nem sempre é verdade. Por mais que todo mundo fale que ama os clientes, poucas pessoas fariam o esforço de ficar sem telefone celular por não gostar dos serviços das operadoras ou deixar de andar de avião por não gostar da confusão na hora do embarque. Então muitas empresas sobrevivem apesar do tratamento que oferecem.
Agora, se você possui um restaurante e um cliente é mal atendido, ele tem várias opções. O mesmo vale para toda a área de varejo. A não ser que você seja o único restaurante da região, as pessoas têm opções. Além disso, o contato com os clientes vai dar a direção de seu negócio. Se você serve um prato e ninguém está pedindo, é hora de mudar o cardápio. Por isso prestar atenção aos clientes e lidar com eles da melhor forma possível é a regra de outro do pequeno empresário.
Quanto a cursos e especializações, e leituras sobre o assunto, eu considero em duas etapas. Há a fase de pré-condições, ou seja, se você quer ser empresário deve saber o suficiente para fechar suas contas, pagar impostos, entender o que seu contador faz, legislação trabalhista, marketing etc. Esse é o básico, a condição para entrar no jogo. Após vencer essa etapa, há os empreendedores que continuam se atualizando, e aí geralmente está a diferença entre os grandes e os mais ou menos. Conheço empreendedores com mais de quarenta anos de experiência que continuam lendo e se atualizando. É preciso dizer que seus negócios estão em boa forma? Embora não seja garantia de sucesso, educação e informação são grandes diferenciais.
Além da capacidade de gestão, é importante o empreendedor conhecer bem o ramo em que pretende atuar. No final das contas, o que pesa mais: o conhecimento do negócio ou a habilidade para administrar?
Só conhecimento não leva a lugar nenhum. É o típico caso do empreendedor que sabe o que deveria fazer e não faz. Tem um caso que ficou famoso, em que Andy Grove, um dos fundadores da Intel, virou para o Gordon Moore, outro fundador, e disse: sabemos que a empresa vai mal. Se fossemos mandados embora, o que os novos diretores fariam? Moore respondeu na hora: fariam processadores. E foi assim que a empresa se tornou um gigante dos processadores. O ponto é que os dois já sabiam a resposta, apenas não tinham coragem de tomar uma atitude. Então é uma mistura dos dois. É preciso conhecer o negócio, mas também é preciso saber arregaçar as mangas e fazer a coisa andar. Um não anda sem o outro. Mesmo quando a pessoa não tem educação formal e tem sucesso como empreendedor, se você conversar com ela, vai ver que ela conhece muito bem seu negócio.
Empreender no Brasil, hoje, não é fácil. Em sua avaliação, qual o porquê dessa dificuldade?
Primeiro, porque tudo é muito complicado. Apesar de existirem iniciativas como o Simples, a verdade é que o governo complica demais a vida das empresas. A legislação sempre vê o empreendedor como malvado, aplica multas, processos, restrições. É até um problema cultural. Então, além da pessoa ter que lidar com a complexidade de montar uma empresa, ainda tem que lidar com o medo de ser processado, de problemas burocráticos e horas de fila, de fiscalizações e pedidos excessivos. Tudo é muito difícil, trabalhoso. As pessoas reclamam que se sentem engessadas pelo sistema. E quando isso está acontecendo é hora de fazer algo. Além disso, o custo de falir é muito alto. O empresário precisa ter segurança de que se as coisas derem errado, a vida dele não acabou. Mas no Brasil o risco de empreender é alto demais. O pior de tudo é que mudar isso é fácil, a receita está espalhada pelo mundo inteiro. É só facilitar a vida de quem abre empresas e diminuir as punições quando as coisas dão errado. Todos os países que fizeram isso viram sua economia prosperar. O governo precisa aprender que melhorar a economia não é sinônimo de fazer propaganda na televisão, mas sim diminuir esse estado monstro e passar a um modelo mais moderno de gestão.
Como a cultura do funcionalismo público, fortalecida nos últimos anos pela corrida dos concursos, interfere no empreendedorismo?
Em primeiro lugar, é preciso lembrar que há sim bons funcionários públicos. São os que estão lá porque querem, porque realmente amam o que fazem. O problema é quando a questão do funcionalismo público passa a ser vista como um "passe livre" para a vida. Todas as pessoas que acreditam que basta passar em uma prova para garantir um salário o resto da vida deveriam ser mandadas embora sem discussão. O problema é que, muitos jovens, atraídos pela promessa de ganhos garantidos, não chegam sequer a considerar opções mais arriscadas. Isso, do ponto de vista da economia, é terrível. Empresas geram empregos, lucro, inovação. O problema é que os riscos de se abrir empresas no país são tantos, que muitos jovens resolvem simplesmente passar em um concurso. Eu entendo um pai que diz ao filho para desistir da ideia de abrir um negócio e estudar algum tempo até passar em algo garantido. Quem não ia querer essa "vida tranquila" para os seus filhos? Em minha opinião, funcionários públicos deveriam passar por avaliações que, sim, resultariam em demissões para os que tiverem baixo de desempenho. É preciso inserir risco no sistema. Acabar com a ideia de que "passou, ganhou" seria bom não só para a economia, mas para o país. É preciso, sim, usar bonificações e punições que foram desenvolvidas na iniciativa privada para o funcionário público.
Um outro ponto é o uso de concursos para medir competência em algo. As pessoas acreditam que medem, mas não é bem assim. Essa corrida dos concursos precisa acabar, pois faz mal tanto economicamente como culturalmente. Muitas pessoas entram ainda muito jovens para o funcionalismo público. Com isso, possuem uma visão distorcida de como funciona o mercado, as empresas etc. Essas pessoas são as mesmas que um dia poderão tomar decisões que afetam esses agentes econômicos, sem nunca terem feito parte da iniciativa privada. Então, como vão entender como é a vida e dinâmica em uma economia de mercado? Me diz em qual prova o Steve Jobs ou o presidente da Coca-Cola passaram? Concursos podem ser um filtro de entrada para a vida acadêmica, mas a vida profissional é mais que isso.
Administradores
Fonte: http://www.administradores.com.br/informe-se/administracao-e-negocios/entrevista-administrando-a-responsabilidade-de-administrar/71088/ acesso em 18 de dezembro de 2012.
Nenhum comentário:
Postar um comentário